quinta-feira, 2 de outubro de 2014

DISCURSO versus PRÁTICA


“Muito se fala, pouco se faz.” Eis uma das frases mais ouvidas ao longo de cinco mil anos de Civilização quando alguém se dá conta do descompasso entre o falar e o agir existente na nossa sociedade.

Não é difícil entender o porquê de nossa pessoa dizer muito mais do que realmente fazer aquilo a que se propõe. É muito mais fácil FALAR do que PRATICAR uma atitude. Mais: a pessoa – com suas afirmações – ganha destaque imediato. Além de que, após alguns dias, semanas ou meses (ou horas...), aquilo que foi dito, mesmo que fervorosamente, tende a ser esquecido pelos outros. Seja importante ou não para o próprio receptor da mensagem.

Não é minha proposta aqui enumerar e condenar os inúmeros vícios humanos passados e atuais relacionado ao discurso, mas procurar algumas das causas fundamentais que levam uma pessoa a ter uma energia e vontade fervorosa para praticar esse discurso, e um completo (ou quase) desinteresse em praticar atitudes, das mais simples (o ato de dar “bom dia”, de tentar puxar assunto com um estranho(a), por exemplo) às mais sólidas (aprender uma nova língua, música, fazer uma faculdade, escrever um livro, elaborar uma teoria,...).

Pela minha intuição, o ESQUECIMENTO é um dos motivos mais proeminentes que conduzem as pessoas a super-valorizarem o discurso, seu ou dos outros (momentaneamente, claro), e não perceberem, ou sub-valorizarem, as atitudes suas e de seus semelhantes – especialmente a destes últimos. Por que? Porque esse ato de esquecer a médio e longo prazo, facilmente, é um tipo de postura que vai desencorajando a prática de qualquer ato que gere resultados a longo prazo. Isto é, encarar afirmativas SÉRIAS como se fossem BRINCADEIRAS é um ato que vai alimentando os “valores” dessa massa chamada humanidade, que passa indiretamente a conduzir a forma de agir (ou não) das pessoas individualmente. Como resultado, gera-se uma força de campo que induz seres a levarem vidas orientadas pelo e para o discurso, e praticarem atividades sempre iguais ou com uma pseudo-variação, padronizada e anti-natural. Raros ainda são os casos de independência completa no agir.

Esse ato de esquecimento sem dúvida é importante e deve ser usado com liberdade. Nossa memória é incapaz de armazenar todas as informações que recebemos no dia a dia. Nem deve, já que MUITA coisa dita não acrescenta nada ,ou até 'desacrescenta'[*], na nossa vida. Mas esse não é o ponto aqui. A questão central é: SERÁ que estamos FILTRANDO de maneira correta? Pensando a longo prazo? Pensando de forma SISTÊMICA? Como de fôssemos parte de um todo, inter-relacionados uns com os outros. Será?

Estamos assim diante de um problema de grande magnitude que é perceptível a um número reduzido de seres (de sensibilidade desenvolvida e visão de futuro telescópica), que são os que mais sofrem internamente ao se darem conta da triste realidade – e mais ainda ao perceberem que nada ou pouco, a passos muito lentos, está sendo feito para alterá-la efetivamente. Dessa forma, devemos procurar nos atentar para essas insatisfações – aparentemente banais para o tipo médio deste globo – e tentar compreender o motivo delas. Pois a única forma de podermos julgar se alguém está louco ou não é:


Primeiro,
Escutarmos o outro.
Segundo,
Compreendermos o que está sendo dito pelo outro.
Terceiro,
Sentirmos essa realidade “imaginada”, usando outros sensores e mais refinamento e mais percepção cósmica.
Quarto,
Raciocinando, a partir da nova sensibilidade, essa realidade, e buscando alterá-la.

Confesso que seguir esses quatro passos requer tempo – às vezes uma vida inteira. No entanto, é a única forma que vejo de tirar a Civilização da inércia moral-espiritual que vem a caracterizando nos últimos séculos. 

A História é prova farta e concreta da subvalorização da prática e supervalorização do discurso. Basta nos lembrarmos do célebre pintor Vincent Van Gogh, que morreu paupérrimo, desprezado e rejeitado por uma moça que amava, mas que hoje é citado despudoradamente e tem seus quadros vendidos por milhões de dólares; ou Schubert, uma virtuose do piano, brilhante compositor, que no entanto nunca teve um piano em sua vida; ou Jimmy Carter, que apesar de uma vida menos trágica, foi desprezado quando presidente por demonstrar razão e ter visão de longo prazo em questões energéticas, de sustentabilidade, de seguridade social, entre outras. Os exemplos são muitos. E no outro extremo, líderes extremamente rudes no campo estatal e privado, ou pseudo-cientistas e pseudo-artistas que, por terem habilidades em se apropriar de ideias alheias e falar de forma agradável no momento certo para as pessoas certas (de poder), puderam colher louros e glória em vida, sem no entanto acrescentarem nada para a humanidade por conta de seu próprio esforço.

Esse é o retrato de forma variada mas substância repetida que traduz a humanidade. E creio que chegou o momento de deixarmos de repetir velhas fórmulas que não mais se adequam às REAIS NECESSIDADES do ser – prestes a nascer – do Terceiro Milênio. Ser este que tende a ser cada ve mais comum em nosso meio. 

Com isso tudo eu, em minha infinita teimosia (consciente, creio eu), sugiro ignorar o que não está de acordo com os sentimentos e vontades mais profundos do seu ser. Ou seja, INDEPENDENTEMENTE de companhia ou não, de garantia de “amizades” ou não, de garantia de “sucesso” ou não, busque praticar as atividades que você sempre desejou quando houver oportunidade.

Não devemos criar barreiras que impeçam nossa evolução para mantermos intacta nossa “boa imagem” na sociedade ou no grupo ou na família ou na empresa ou etc. A única imagem que devemos valorizar é a nossa perante a Eternidade.

* me pareceu legal esse neologismo

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