segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Por que Bertrand Russel deveria ser estudado (à fundo) nas escolas

Devo confessar que sou uma pessoa que está se tornando mais seletiva a cada dia. É talvez um dos efeitos do passar do tempo – um efeito maravilhoso, diga-se de passagem. A menor quantidade de horas restantes nessa existência, quando percebidas, começam a ganhar uma importância maior. Selecionamos melhor nossas atividades. Sem medo ou vergonha. Escolhemos com critério as coisas: onde vamos viajar, que música vamos ouvir, que filmes vamos ver, que coisas vamos escrever, com quem vamos nos encontrar e conviver, o que estudar, do que realmente gostamos, que livro queremos ler. Etc.

Desse efeito benéfico do tempo pode-se acumular experiências vívidas e enriquecedores. Mesmo que sua existência não tenha sido longa para os padrões de longevidade atuais. Eu diria que uma pessoa com todas condições materiais necessárias garantidas – aliadas a um bom ambiente familiar e social – pode chegar à porta dos trinta anos com uma noção clara do mundo e de sua própria vida. Isso é fundamental para a orientação do indivíduo nos anos posteriores, que poderá guiar sua vida em sintonia com seus verdadeiros sentimentos – e conseqüente objetivos.
Bertrand Russell (1872-1970)

Um dos livros mais interessantes que li em minha vida se chama

A Conquista da Felicidade”.

O autor é um britânico de família aristocrática chamado Bertrand Arthur William Russell. Ele viveu quase um século e fez muito bom uso de cada segundo de sua vida. Até o último momento esse ser interdisciplinar sempre lutou pela justiça, pela difusão do conhecimento, pela aproximação dos seres humanos, pela liberdade de questionamento e expandiu diversas áreas do conhecimento, publicando trabalhos sobre matemática, lógica, economia, história e temas sociais. Não bastasse isso, seu domínio da escrita lhe garantiu o Prêmio Nobel em 1950, tamanha era a facilidade com que escrevia sobre os diversos temas de seu interesse.

Pode-se dizer que esse foi um dos homens que conseguiu unir a vida profissional e pessoal. Isto é, se trata de alguém que conseguiu se distrair através do seu trabalho. E (consequentemente) trabalhar na sua distração. Dessa forma, não é de se espantar que B. Russell tenha escrito um livro com a palavra “felicidade” no título.

Homem evoluído, muito adiantado para sua época, Russell era pacifista, preocupado com a falta de racionalidade dos líderes de sua (e todas) épocas. E preocupado com a questão moral. E não era capaz de uma coisa: abandonar seus princípios em troca de cargos ou poder ou dinheiro. Preferia ser expulso de um meio a trair sua consciência. Tanto que foi destituído de seu cargo em Cambridge por adotar uma postura pacifista na Primeira Guerra, em 1916. Era um verdadeiro sábio, que desmascarou os falsos pré-conceitos que a sociedade vinha alimentando a respeito de diversos temas polêmicos. Dentre eles o socialismo, o ócio, o papel da mulher e a importância da boa formação das crianças.

Eu tenho a crença de que, com um programa curricular bem estruturado, com docentes capacitados e estimulados, seria possível fazer brotar um interesse genuíno dos alunos pelos fenômenos do mundo. O estudo e o questionamento (construtivo) podem se tornar prioridades para nossos jovens, se houver uma introdução adequada. Deve-se começar pelas obras mais próximas aos desejos de todos: Elogio do Ócio, Elogio do Lazer e A Conquista da Felicidade. Estes livros, por não exigirem conhecimentos específicos dos alunos, são ideais, pois os temas são universais e, portanto, ao alcance de todos. Há inclusive, a meu ver, uma lógica muito interessante nesse tipo de abordagem, que explicarei a seguir.

É evidente que, quando chegamos a este mundo, sentimos as coisas antes de elaborarmos pensamentos e opiniões a respeito delas. E os primeiros pensamentos vem na forma intuitiva. Apenas anos depois, com a escolarização, é que tudo aquilo que vivenciando vem sendo sistematizado de forma racional. Por isso é tão importante garantir uma conexão forte entre a realidade do aluno e a teoria que se pretende ensinar em sala de aula. É o único modo de garantir a FORMAÇÃO adequada de um ser humano, a meu ver.

Não diria que existe uma época adequada para a introdução de temas desse tipo (felicidade e suas relações com o cotidiano), mas acho que o adolescente já poderia ter em mente que existiram caras que inventaram um monte de teoremas, pensamentos, idéias e sistemas "chatos" mas ao mesmo tempo escreveram - ou se preocupavam...ou ambos - com temas fundamentais, comuns a todos nós. Isso é importante para estabelecer aquela ligação especial, que é a semente que pode gerar o comprometimento. A identificação é sentimento fundamental para obter o melhor de um ser humano.

Pessoas passam a vida inteira sendo vistas como inúteis ou vagabundas simplesmente porque o modelo vigente não é adequado para obter o máximo de cada ser humano em sua individualidade. O modelo, não sendo adequado para eles, impõe aos outros uma adequação forçada. Uma conformação. E aos poucos as pessoas acabam se rendendo, internalizando sentimentos e idéias e formas de agir em completo desacordo com sua essência. E essas sensações acabam por ficar tão internalizadas que a pessoa acaba por se perder na vida, se esquecendo completamente do que realmente gosta e quer. Tudo isso apenas por causa da (ainda) necessidade de se submeter a horas intermináveis numa atividade que não necessita de tanto tempo e energia. Para obter o necessário para subsistência.

Um último motivo para conhecermos as obras de Bertrand Russel: faria bem para a nossa saúde mental e - consequentemente - física.

No entanto, me parece cada vez mais difícil encontrar pessoas dispostas a abrirem um livro útil como "A Conquista da Felicidade" (e curto!...160 páginas...pequenas) e mergulharem nesse universo. Porque o indivíduo deve dedicar horas infindáveis para estar à disposição de um sistema que não retribui nada para ele, exceto materialmente. E apesar disso, um materialmente desnecessário e alienante (consumismo), e conseqüente aprisionamento - as dívidas nunca acabam...

Me pergunto se é isso que as pessoas realmente querem de suas vidas.

É compreensível que sair de algo que fomos condicionados a vida inteira a fazer não é fácil. Pior: é doloroso. Mas existem seres tão determinados em sua busca, que eles farão de tudo para alcançar (e contribuir para que outros alcancem) um novo patamar social, individual, espiritual. Porque nunca ninguém soube responder suas perguntas. Perguntas fundamentais, cujas respostas são apresentadas de forma vazia, padronizada e incompleta. Respostas essas que refletem a sociedade dominante atual. Respostas que não vão nas causas. Apenas no lugar comum - cada vez mais comum em alguns meios.

Precisamos voltar a valorizar o estudo e o lazer. Dar tempo para os indivíduos e deixarmos de gastar tanta energia em coisas inúteis. Dar tempo para que as pessoas possam passar em ambientes abertos, com luz, com gente diferente. Dar tempo e energia para que todos possam pensar e refletir. Em todas fases da vida. São os ingredientes fundamentais da inovação, da criatividade e da saúde.

Infelizmente ainda existem (muitas) pessoas em altos cargos dispostas a distorcerem pensadores e estudos conceituados em detrimento delas mesmas ou de um sistema que dá claro sinais de falência. Sistema que inclusive aprisiona essas pessoas, que se julgam no controle de suas vidas e da vida dos outros. Mera ilusão. No longo prazo as conseqüências começarão a vir à tona. Cada vez mais intensas, cada vez mais dolorosas para os "bem sucedidos". E prazerosas para os "fracassados".

Lendo os trabalhos de B. Russell é essa a sensação que eu tenho. Devemos repensar nossas vidas e deixar de implementar fórmulas ultrapassadas do século XIX (ou XVIII...) para uma vida do século XXI.

Bertrand Russell deve ser um dos missionários enviados por criaturas celestiais para promover a inteligência e a moral na Terra. 

Dois Conselhos para as Gerações Futuras:

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